Capítulo 20

Sua consciência voltava aos poucos, no primeiro momento via somente borrões coloridos, se movendo e tagarelando, ouviu uma voz familiar e sentiu uma mão a tirando do chão e arrastando-a para longe. Seus olhos fecharam mais uma vez, a última coisa que se lembrou foi das pessoas desorientadas e enfurecidas.
“Você não pode se estressar com essas coisas, uma hora ou outra iria acontecer...”. O adolescente sorriu timidamente ao ver seu livro ainda nas mãos de Carmen. A mesma estava se sentindo melhor, sentia sua perna esquerda formigando, provavelmente deitou encima. O garoto não tinha mais um rosto doce e inocente que ela costumava enxergar; Possuía um olhar sério, tenso, triste. A voz era rouca, desanimada. Carmen não via mais um adolescente, via um homem, um homem mais velho que ela.
O calor e a luz do fogo faziam a sala ter um ar aconchegante, acolhedor. Ele olhava compenetrado para as chamas dançantes, as rugas de preocupação ficaram mais profundas.
-Porque você ainda ama a menina que te traiu? – disse ela.
Ele fechou os olhos, começou a sentir o ar mais denso e a boca secar.
-Não sei se você já sentiu algo que faça a sua cabeça girar, seus sentimentos aflorarem e tudo ao seu redor se tornar mais vivo. Eu tinha certeza de que ela era a mulher da minha vida, sabia que nem ela entendia, era algo forte demais para a nossa idade. Eramos só crianças, meu Deus! A fiz sofrer tanto! O que aconteceu foi bem feito para mim, mas... Por causa de um deslize desse, não vou abandonar o que sinto, mesmo que eu queira esquecer, mesmo que eu tenha que seguir em frente sabendo que esse fantasma nunca mais vai deixar meu corpo, mente e alma se orientarem. – Ele respirou fundo e passou a mão no rosto, voltou-se para a direção de Carmen e sentou ao seu lado:
-Mas... enfim, você terminou de ler?
-Não, ainda estou na parte que você volta para a sua cidade natal e...
-Por favor, eu imploro, depois que você ler os papéis que eu te dei, jogue eles fora, não guarde, não mostre, livre-se deles.
“Tem certeza que é assim que você vai se livrar dos fantasmas do seu passado?” – disse ela impacientemente.
O menino foi em direção a porta da sala, parou na frente da mesma, olhou para Carmen, e seguiu seu rumo ao desconhecido.